Dor lombar – Como tratar?

O tratamento da dor lombar é um desafio multifatorial que requer uma abordagem abrangente e personalizada, dado o impacto significativo desta condição na funcionalidade e na qualidade de vida dos utentes. A dor lombar pode ser classificada como específica ou inespecífica, e cada uma exige estratégias terapêuticas distintas. Enquanto a dor lombar específica resulta de condições diagnosticáveis, como hérnias discais ou estenose espinhal, e requer tratamentos direcionados à causa, a dor lombar inespecífica, que constitui a vasta maioria dos casos, é tratada com foco na gestão dos sintomas e na reabilitação funcional.

 

Fisioterapia no Tratamento da Dor Lombar

Entre as várias opções terapêuticas, a Fisioterapia destaca-se como uma abordagem central e de primeira linha no tratamento da dor lombar, com benefícios comprovados na melhoria da mobilidade, no fortalecimento muscular e na prevenção de futuras crises. A Fisioterapia atua não apenas no alívio imediato da dor, mas também na promoção de um retorno gradual e seguro às atividades diárias, ajudando os utentes a desenvolverem uma maior resistência física e a adotarem hábitos de vida mais saudáveis.

Dado o vasto espectro e as diferentes manifestações da dor lombar, o tratamento deve sempre ser acompanhado de uma avaliação individualizada, que permita identificar as principais preocupações do utente, possíveis fatores de risco e, em conjunto, delinear um plano personalizado. Esta abordagem visa traçar objetivos claros, assegurando que o tratamento está em conformidade com as necessidades e expectativas do utente.

De seguida serão apresentadas as armas terapêuticas suportadas pela Organização mundial de Saúde à qual a Fisioterapia pode recorrer no tratamento da dor lombar.

Cirurgia Vs Fisioterapia

Na grande maioria dos casos, o tratamento conservador (fisioterapia) é preferível ao tratamento invasivo (cirurgia). A evidência demonstra que tanto a fisioterapia como a cirurgia apresentam resultados semelhantes a longo prazo, mas a fisioterapia envolve menos complicações ao longo do tempo. Mesmo que a pessoa opte pela cirurgia, é fundamental que seja acompanhada por fisioterapia tanto no período pós- operatório como a longo prazo. A fisioterapia é essencial para restaurar a mobilidade, fortalecer os músculos e reeducar padrões de movimento que possam ter sido alterados pela dor ou pela cirurgia. Além disso, a fisioterapia ajuda a prevenir futuras complicações ou recidivas, assegurando que o utente retoma as suas atividades diárias de forma segura e progressiva. Sem este acompanhamento, o risco de complicações, como rigidez articular ou fraqueza muscular, pode aumentar, comprometendo os benefícios da cirurgia a longo prazo.

Em suma, é recomendado olhar para a fisioterapia como 1ª abordagem antes de considerar a cirurgia. Na maioria dos casos a fisioterapia oferece resultados semelhantes a longo prazo, com menos riscos e complicações. Enquanto a cirurgia é invasiva e acarreta potenciais efeitos adversos, a fisioterapia promove a recuperação natural do corpo.

Exercício

O exercício clínico estruturado é uma intervenção essencial no tratamento da dor lombar, definido como uma subcategoria de atividade física que é planeada, estruturada e repetitiva, com o objetivo de melhorar ou manter componentes específicos da aptidão física, como a força muscular, a amplitude de movimento ou a capacidade aeróbica. Ao contrário de programas autodirigidos, como caminhadas por conta própria, o exercício clínico estruturado é prescrito e supervisionado por profissionais de saúde, sendo essencial que a sua orientação venha de alguém qualificado para garantir segurança e eficácia.

O exercício clínico estruturado é eficaz em várias modalidades, incluindo treino de força muscular, flexibilidade, Pilates, hidroterapia, entre outros. No entanto, não há evidências que sugiram que uma modalidade seja superior a outra. Assim, a escolha do tipo de exercício deve ser feita em conjunto com o utente, considerando suas preferências, acessibilidade, disponibilidade e contexto sociocultural. Esta abordagem de decisão partilhada permite selecionar uma intervenção significativa e aceitável, maximizando a adesão ao programa.

Os programas que são personalizados e supervisionados (seja em grupo, individualmente ou em casa com acompanhamento regular) tendem a ser mais eficazes, especialmente quando a adesão é alta, com uma dose mínima de 20 horas ao longo do programa. Um formato de grupo pode também aumentar a adesão, sobretudo entre os idosos, ao promover o comprometimento social e a aprendizagem colaborativa.

Para utentes com dor lombar crónica persistente, especialmente idosos, é importante realizar uma avaliação cuidadosa das suas capacidades físicas e mentais, considerando eventuais comorbidades e limitações na capacidade intrínseca.

 

Terapia com Agulhas

As terapias com agulhas incluem acupuntura da medicina tradicional chinesa (MTC) e outras modalidades de punção seca, como a estimulação de pontos gatilho miofasciais. Essas técnicas envolvem a inserção de agulhas em pontos meridianos clássicos (no caso da MTC) ou em pontos de gatilho dos tecidos moles (nas outras modalidades de punção seca).

Considerações Importantes:

  • As terapias com o uso de agulhas devem ser administradas por profissionais de saúde com conhecimento sólido de anatomia, garantindo a inserção segura e apropriada das agulhas.
  • Dado que os benefícios do tratamento com agulhas são predominantemente de curto prazo, esta terapia deve ser combinada com outras abordagens, como exercícios, reabilitação física e educação sobre a dor, para proporcionar uma recuperação funcional mais eficaz e

Em resumo, as terapias com agulhas, como a acupuntura, podem ser eficazes no alívio temporário da dor lombar, mas devem ser utilizadas em conjunto com outras formas de tratamento, garantindo uma abordagem mais completa e integrada para a gestão da dor lombar crónica.

 

Terapia Manual

 

Manipulação/Mobilização Articular

 

A Manipulação/Mobilização Articular é uma técnica manual que envolve o movimento das articulações da coluna vertebral. Esta terapia inclui tanto manipulações de alta-velocidade e baixa-amplitude, que são acompanhadas por um “crack” audível, como mobilizações de baixa-velocidade e baixa-amplitude, que utilizam movimentos passivos dentro do limite de controlo da articulação. A manipulação é frequentemente utilizada para proporcionar alívio temporário da dor e melhorar a função em curto prazo.

No entanto, é importante destacar que os efeitos da terapia manual são, na maioria dos casos, de curta duração. Embora manipulação/mobilização possa proporcionar um alívio imediato na dor e melhorar a mobilidade, os seus benefícios tendem a ser temporários, sendo por isso essencial que não seja utilizada como uma intervenção isolada. Para maximizar os seus efeitos e promover uma recuperação sustentada, a terapia manual deve ser integrada num plano de tratamento mais abrangente, baseado numa avaliação biopsicossocial.

Considerações Essenciais:

  • A manipulação/mobilização vertebral deve ser administrada apenas por profissionais de saúde qualificados e treinados, garantindo a segurança do utente durante a aplicação da técnica.
  • É fundamental avaliar possíveis contraindicações antes de iniciar a técnica, particularmente em populações de maior risco, como idosos com osteoporose ou fraturas de fragilidade.
  • Dada a sua natureza de curto prazo, a manipulação vertebral deve ser combinada com outras intervenções terapêuticas, como exercício físico, apoio psicológico e educação sobre a dor, para proporcionar um tratamento mais eficaz e duradouro.

Massagem

A massagem é uma técnica manual que envolve a manipulação de tecidos moles do corpo com o objetivo de promover a saúde e o bem-estar. Praticada globalmente, existem mais de 80 formas diferentes de massagem, que podem ser utilizadas para diversas finalidades, como relaxamento, alívio da dor, melhoria do desempenho atlético, entre outras. No contexto da dor lombar crónica persistente (CPLBP), a massagem pode ser aplicada de forma ampla, abrangendo a manipulação de tecidos moles com as mãos ou dispositivos mecânicos, e pode envolver a região lombar ou o corpo inteiro.

Embora a massagem possa oferecer melhorias a curto prazo na dor e na função, é crucial destacar que não deve ser utilizada como uma intervenção isolada. Devido aos seus efeitos curtos e temporários, a massagem, deve ser integrada num plano de tratamento, que considere outros componentes terapêuticos, com base numa avaliação biopsicossocial.

Considerações Importantes:

  • A evidência sobre os benefícios da massagem em pessoas idosas é limitada, pelo que deve ser aplicado um julgamento clínico cuidadoso ao avaliar o equilíbrio entre os potenciais benefícios e riscos, especialmente em utentes mais
  • Embora a massagem possa proporcionar um alívio temporário da dor, os utentes devem ser informados sobre a possibilidade de um aumento da dor no curto prazo, logo após a sessão.
  • A massagem deve ser oferecida como parte de um conjunto mais amplo de tratamentos eficazes para a dor lombar, integrando outras abordagens como exercício, educação e apoio psicológico, para garantir uma recuperação funcional mais completa.

 

Em resumo, embora a terapia manual possa ser uma ferramenta útil para o alívio rápido da dor lombar, o seu efeito temporário exige que seja integrada num plano de tratamento multidisciplinar, de modo a garantir uma recuperação funcional mais completa e duradoura.

 

Técnicas Contraindicadas

A OMS sugere que certas modalidades terapêuticas frequentemente utilizadas no tratamento da dor lombar não devem ser recomendadas de forma isolada, devido à falta de evidência robusta sobre a sua eficácia, especialmente em longo prazo.

 

Tração

A tração espinal envolve a aplicação de uma força de distração ao longo do eixo da coluna vertebral, utilizando o peso do corpo, pesos externos ou polias. Existem diferentes tipos de tração, como a tração mecânica, manual, auto-tração e até métodos mais incomuns, como a tração subaquática e a tração gravitacional. No entanto, as evidências disponíveis não suportam a eficácia da tração no alívio da dor lombar, sendo contraindicada como tratamento padrão, uma vez que os seus benefícios são questionáveis e temporários.

 

Ultrassom Terapêutico

O ultrassom terapêutico utiliza ondas ultrassónicas para aquecer tecidos profundos ou provocar mudanças fisiológicas não térmicas com o objetivo de reduzir a dor, inflamação e acelerar a cicatrização. Apesar de amplamente utilizado em fisioterapia, as evidências sugerem que o ultrassom tem efeitos mínimos ou insignificantes no tratamento da dor lombar e não é recomendado pela OMS como uma abordagem eficaz para esta condição.

 

Estimulação Nervosa Elétrica Transcutânea (TENS)

O TENS é uma técnica de estimulação elétrica aplicada à pele por meio de elétrodos, com o objetivo de modificar a perceção da dor através da inibição segmentar ou ativação dos sistemas nociceptivos inibitórios descendentes. Embora possa oferecer alívio temporário em alguns casos, os estudos não mostram evidência suficiente para apoiar o uso regular de TENS no tratamento da dor lombar crónica, sendo contraindicado como terapia de primeira linha.

 

Produtos de Assistência

Os produtos de assistência, como cintas, faixas lombares e dispositivos de mobilidade (cadeiras de rodas, bengalas, andadores), são frequentemente usados para limitar a mobilidade da coluna ou reduzir a sobrecarga mecânica na lombar. Embora possam ser utilizados em alguns casos para prevenir recorrências de dor ou como suporte temporário, os benefícios a longo prazo são incertos. A OMS não recomenda o uso regular de cintas lombares como tratamento para dor lombar, pois, para além de não proporcionar benefícios duradouros, podem levar a um enfraquecimento muscular com o uso prolongado.

A OMS desencoraja o uso dessas modalidades no tratamento da dor lombar, uma vez que a evidência científica não apoia consistentemente a sua eficácia.

 

Artigo elaborado por:

Rafael Mariz

Fisioterapeuta Especialista em Exercício Clínico e Performance;
Fisioterapeuta na Clínica Tiago Duarte – Saúde e Performance